sexta-feira, julho 26, 2013

Frustração de um Filho que é Pai da Geração de 80

Meu Pai e pais de todos os joves da geração de 50/60, responsáveis por nós, jovens inconformados da geração de 80:

Vejo, tanto em ti, como em todos os pais da geração de 50/60 que se encontram agora a “desculpar” algumas más atitudes de nós, filhos da geração de 80. Mas deixa-me também explicar o meu ponto de vista, a minha desilusão, a minha inconformidade, não com a minha situação actual mas com a situação da maioria dos meus companheiros e jovens que nasceram da Geração da Liberdade, a geração de 80.

Tens toda a razão, meu pai e minha mãe que “no vosso tempo” tudo era bastante mais difícil e que vocês, nossos pais, tudo fizeram como puderam para nos ver crescer. Trabalharam arduamente, muitos de vocês dia e noite. Tu, pai, trabalhavas desde a manhã até à noite, a mãe ficava em nossa casa para nos cuidar, e tu, assim continuavas, dia e noite, sabados, domingos e feriados. E cuidaste de nós... Sim cuidaste de nós de um modo que sabemos nós agora, como pais, que não conseguiremos cuidar da mesma maneira. Começa aí a nossa frustração.

Mas de mim e de vários jovens como eu já nos ouvis-te dizer “Mas os tempos agora são outros...” E é verdade que são... Ou ainda não deste conta? No vosso tempo começavam a trabalhar cedo, a começar a descontar para uma Caixa de Previdência que era só para alguns e que de repente se transformou numa Segurança Social, mas que garante agora ao que tu chamas, a tua pensão. Seja com cortes, diminuições, abatimentos... É a tua pensão. Muitos pais como tu nem contrinuiram para essa Caixa de Previdência, mas mesmo a esses não lhes falta (por pequena que seja) uma pensão.
Muitos de vós, pais, durante a década da nossa geração, não sei se a pensar nos seus filhos, pegaram em “subsídios e apoios” que nesse tempo apareceram aos montes para a agricultura e em vez de os investir onde se devia... compraram carros, jipes, melhoraram as casas “para si e para os seus filhos”, esquecendo que, como tu nos ensinas-te, que só do trabalho é que viria o “pão de cada dia”. Agora não temos uma agricultura consistente, um sector primário produtivo, dependendo de outros países para a nossa própia subsistência e agora a vossa geração acha graça “às manias” destes novos Jovens Agricultores que fazem de tudo para defender uma reforma agrária que já deveria ter acontecido no vosso tempo. E depois somos nós os que não compreendemos...

Falas como pais e mães como os teus amigos que descontavam para a ADSE e para o “diabo a sete” e trabalhavam na função pública? Eu falo-te na facilidade que havia no teu tempo em qualquer um entrar para a função pública. Falo-te na facilidade que havia entre todos os da tua geração em poder dizer “Arranja-me um tacho lá na câmara!”, ou na repartição, ou na segurança social, ou na escola ou na creche pública. Poderia não havser muito trabalho no sector privado... Mas arranjava-se sempre alguma coisa na função pública. Pelo menos pais e mães da tua geração sempre tinham emprego. Nunca a Cunha tinha sido tão bem utilizada nesse tempo de início da liberdade como nessa época... Agora, meu pai, nem com Cunha nem nada se entra para esse tipo de empregos. Não há trabalho para ninguém!!! Ou ainda não ouviste? Também é verdade, meu pai, que muitos da tua idade saíram do seu país para tentar a sorte em outros países, seja na Europa ou no resto do mundo. E agora? Já notaste quantos da minha idade já saíram das suas casas para outros países? Países esses que agora nos encerram as portas? Será que os tempos eram assim tão iguais ou estão realmente diferentes?

Ah, é verdade... falas no dinheiro gasto em nós nos estudos. E tens toda a razão.... Cada vez mais olho para os meus amigos e colegas da minha geração e vejo o quanto mal gasto foi esse dinheiro!!! Mas não foram vocês que nos diziam “Estuda, meu filho, para seres alguém e teres emprego”. Verdade seja dita, eu não me posso queixar, meu pai, pois como alguns sortudos como eu conseguiram trabalhar nos “negócios da família”, continuando o trabalho deixado por vocês, pais, para então perdurar pelos filhos. Mas outros como nós, pergunto... Porque estudaram!??? Se antes lhe diziam... “Não podes trabalhar pois não tens um curso superior...”, agora dizem “Não podes trabalhar porque não tens experiência profissional”, pois iríamos ocupar lugares de vocês, pais, que, com todo o direito, nâo se retiram do posto de trabalho, não se aposentam, não se reformam. Mas que também com essa atitude conseguiram fazer com que nós, jovem, tenhamos mais de 47% de desemprego. Achas assim isto incentivador para estudar? Achas incentivador para enriquecer adacemicamente? Mas continuo a falar, meu pai, que felizmente não é a minha situação. Eu estudei até aos 27 em universidade privada para tirar um curso que não consegui entrar com média suficiente na pública, para que esse curso me desse uma “enchada” no negócio de família, para ter, de um modo possível, o futuro meu e dos meus garantido. Daí eu te agradeço esta tua herança e investimento. Só espero que não seja “a fundo perdido”.

E agora, ao ser pai, também penso... Será que valerá a pena estudar para ter um trabalho no futuro? Não sei... Ainda não consegui responder a essa pergunta... Já viste a incertesa que agora nós, filhos temos no nosso mundo, incertesa essa que não existia no vosso tempo, meu pai? Mas felizmente tens a tua reforma, os teus cuidados de saúde, pagos com os teus, parte dos meus e dos impostos de todos que ainda trabalham... Olha que estranho e interessante... “Reforma”... complemento que agora, nós, filhos, só o temos como parcialmente garantido se guardarmos algum através de complementos de reforma privados, e mesmo assim sem qualquer garantia de retorno, pois acreditar que a reforma do teu, meu, nosso serviço de segurança social (aquela da Caixa da Previdência do vosso tempo) e como contar com o “ovo da cloaca das galinhas” (isto para não ser muito drástico nas palavras). Durante muitos anos, meu pai, tinhas um serviço de saúde que pouco pagavas de taxas e deles te servias sempre que necessitavas. Agora ir a um serviço de saúde começa a ser para nós, filho, uma questão de escolha monetária, pois se o valor a pagar é praticamente igual no privedo e no público perguntamo-nos... Afinal para que é que estamos a pagar para pagar ainda mais?... E os incentivos que pais da tua geração receberam em abonos de família (mesmo que tenham sido pequenos)? É que desde que o meu filho nasceu que apenas têm pago ao estado... dele não recebeu nem um cêntimo de apoio. E olha que o teu neto apenas têm 3 anos... E já paga ao estado... Pode ser pouco... mas já paga (nem eu com essa idade pagava ao estado).

Ainda não achas que não temos direito de nos manifestar? É que a situação de agora, completamente diferente dos vossos tempos, não foi feita por nós!!! Porque não falas com os da tua geração que, por diversos factores, enriqueceram à custa do descontrolo das liberdades, através da especulação bancária, da fuga aos impostos!!! E que assim contribuiram para que a nossa geração esteja na penúria, com desemprego elevado, a pedir mais algumas migalhas para viver, pois não foram eles que fizeram parte desta crise!!! Mas que estão a pagar quase com a vida para sair dela.
Pelo menos, meu pai, tens a tua reforma. Eu, em contrário e a nossa geração não sabe se amanhã sequer tem trabalho (as coisas mudam tão rapidamente) e assim não sabemos que tipo de futuro teremos para nós e para os nossos filhos, teus netos... Mas cá nos havemos de aguentar, mesmo com a certesa que do estado nada teremos de ajuda.

Desculpa se como filho te estou a chatear com a nossa manifestação e medo do futuro, por ver tanto dinheiro a ser tão mal gasto em certas coisas que a tua geração não quer deixar de ter ou que olha sempre para o seu bolso, com o dinheiro dos outros. Mas estou a ver como lutar pelo meu futuro, pela tua reforma e pelo futuro dos teus netos... Mas descansa... que pelo menos tens uma pensão... pode ser pequena, mas a tens...

P.S.: Não se trata de uma carta com sentido crítico directo, mas sim de uma análise à carta publicada por Susana Toscano, na Quarta República. Felizmente tenho pais que lutaram para nos dar o que eu tenho agora e os quais me orgulho muito. E tenho uma profissão, um trabalho, um sustento para mim epara os meus, tirado à custa de muito trabalho e sacrifício dos meus pais... Mas nem todos os jovens tiveram a sorte que eu tive.

Hugo Filipe Gaio Loureiro

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